Equipamentos previstos na NR 6 protegem trabalhadores expostos a atmosferas nocivas, prevenindo intoxicações e doenças
Desde o início de 2020 Equipamentos de Proteção Respiratória são adotados por grande parte da população mundial para prevenir o contágio da Covid-19 por meio de gotículas respiratórias expelidas por tosse ou espirro ou partículas ainda menores (aerossóis), que podem permanecer suspensas no ar por horas. A recomendação da Organização Mundial da Saúde trouxe conhecimento para o público em geral sobre o assunto e até chegou a ocasionar a falta das máscaras PFF2 (Peças Faciais Filtrantes com filtros classe 2). Mas a medida que segue sendo uma das principais para o controle da pandemia já é velha conhecida na área de Segurança e Saúde do Trabalho.
Um dos Equipamentos de Proteção Individual previsto na Norma Regulamentadora 6, o EPR deve ser utilizado em ambientes laborais em que o trabalhador é exposto a atmosferas nocivas a sua saúde. Dependendo da atividade realizada, é possível a exposição a uma série de poluentes, como fumos, poeiras, neblinas, microorganismos. A proteção também se faz essencial para entrada em espaços com deficiência de oxigênio, com a presença de contaminantes atmosféricos em concentrações desconhecidas ou imediatamente perigosas. Assim como para atendimento a emergências que envolvam liberações de gases, vapores ou presença de produtos de combustão de materiais orgânicos em geral.
O uso de respiradores em cada uma dessas situações pode ser o único meio de proteção viável para garantir a saúde e a vida do trabalhador ou a última barreira de controle, considerando que a empresa já adote controles na fonte e na propagação, com uso de enclausuramentos e ventilação exaustora localizada. Assim como os demais EPIs, eles devem ser fornecidos gratuitamente pelo empregador, em perfeito em estado de conservação e funcionamento, seguindo uma hierarquia de controle. Ou seja, sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes ou doenças laborais, ou enquanto as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas e para atender a situações de emergência.
EFICÁCIA DOS EPRs
A escolha do Equipamento de Proteção Respiratória é responsabilidade da empresa, junto à equipe técnica, e deve considerar o tipo de atividade desenvolvida, a frequência de exposição e os perigos que oferecem às vias aéreas do trabalhador. Nas tarefas rotineiras em que há exposição a contaminantes atmosféricos, ainda que em concentrações pequenas, existe a possibilidade de o trabalhador desenvolver doenças irreversíveis após longos períodos. Desse modo, o emprego do EPR adequado pode evitar a origem de múltiplas doenças relacionadas ao trabalho, como asmas profissionais, mesoteliomas ou pneumoconioses. Também previne intoxicações agudas por via respiratória resultantes da inalação de gases ou substâncias voláteis com efeitos tóxicos, como monóxido de carbono e solventes orgânicos.
O Equipamento de Proteção Respiratória previne até mesmo a morte de trabalhadores, pois emergências e ocorrências que envolvem liberação de gases, vapores e particulados tóxicos podem levar a fatalidades, uma vez que a atmosfera pode ser imediatamente perigosa à vida. Essa situação conhecida como IPVS (Imediatamente Perigoso à Vida e à Saúde) ocorre devido à presença de agentes químicos nocivos asfixiantes em altas concentrações ou falta de oxigênio, que podem provocar lesões irreversíveis, morte ou impedir que o trabalhador abandone a área contaminada.
Os respiradores disponíveis no mercado são divididos em duas classes: ‘Respiradores de adução de ar’ e ‘Respiradores Purificadores de Ar’, e várias categorias. Por isso, a escolha do equipamento mais adequado depende de avaliação prévia. Por exemplo, ambientes com deficiência de oxigênio requerem respiradores com suprimento de ar. Já atmosferas tóxicas requerem respiradores com alto nível de proteção. Por sua vez, trabalhos rotineiros realizados em ambientes industriais ou de serviços com baixa toxicidade e baixa concentração requerem o uso de respiradores que sejam ‘confortáveis’, fáceis de respirar, leves e com boa vedação facial.
REQUISITOS
Para avaliar a adequação do respirador à tarefa que será desenvolvida pelo trabalhador, deve-se levar em consideração a exposição do trabalhador a agentes nocivos durante a realização da atividade ou atendimento a emergências. Assim como a demanda do trabalho, incluindo distanciamento entre o local da exposição e um local limpo e seguro e o esforço físico requerido pela tarefa.
A seleção do Equipamento de Proteção Respiratória também deve considerar sua adequação ao usuário e ao ambiente de trabalho. No primeiro caso, são avaliados os aspectos relacionados ao uso de outros Equipamentos de Proteção Individual, características faciais e, principalmente, a vedação facial promovida pelo respirador. Já no segundo caso são consideradas condições atmosféricas como calor, frio e situações especiais.
Tais etapas são detalhadas no ‘Programa de Proteção Respiratória – Recomendações para Seleção e Uso de Respiradores’ da Fundacentro (https://bit.ly/3EHMppP) que deve ser implantado pelas empresas cujos riscos podem afetar o trato respiratório dos trabalhadores. O Programa deve conter procedimentos para seleção, ensaios de vedação facial, exames médicos específicos para usuários de respiradores, guarda, manutenção, monitoramento ambiental e de uso de respiradores, além de requisitos administrativos como treinamentos e indicação de um administrador. De acordo com a publicação, o médico e o administrador do PPR possuem responsabilidades importantes na administração e seleção de respiradores. O médico deve avaliar a aptidão física e mental, além das características faciais dos usuários. O administrador deve garantir que o respirador selecionado seja adequado ao usuário. Por isso, a importância do ensaio de vedação facial no procedimento de seleção de respiradores.
Além disso, deve-se garantir que o produto possua Certificado de Aprovação válido, emitido pelo Ministério do Trabalho e Previdência. O CA garante a qualidade do Equipamento de Proteção Respiratória e sua eficácia na proteção do trabalhador quando exposto à atmosfera nociva.
Seleção acertada
A escolha do EPR ideal deve considerar fatores como a situação de uso e a demanda de trabalho
Conhecer os Equipamentos de Proteção Respiratória disponíveis no mercado, e de que forma cada um protege o trabalhador, é um passo importante para uma escolha acertada. Os ‘Respiradores de Adução de Ar’ recebem ar limpo vindo de fora da área contaminada e podem utilizar válvulas de demanda que mantêm pressão positiva no interior da peça durante todo o tempo ou linha de ar com fluxo contínuo que mantém excesso de ar dentro da peça facial. Já os ‘Respiradores Purificadores de Ar’ utilizam o ar do próprio ambiente de trabalho. Esses equipamentos possuem uma cobertura facial que pode ser uma peça facial inteira, peça semifacial, capuz ou capacete.
Em ambas as categorias os respiradores possuem algum sistema de purificação de ar. Nos respiradores de adução de ar um sistema de filtração é colocado entre o compressor e o sistema que vai receber e distribuir o ar purificado. Nos respiradores purificadores de ar, os filtros são incorporados à cobertura facial e são específicos para reter os contaminantes presentes no ar ambiente.
No processo de seleção do melhor respirador deve-se primeiramente considerar a situação de uso, se rotineira, ocasional, para atendimento ou fuga de uma emergência química ou incêndio. Os colaboradores que atuam em atividades que envolvam exposição a particulados são aqueles que, geralmente, utilizam os Equipamentos de Proteção Respiratória de forma rotineira. O processamento de madeira em marcenarias e a produção de pranchas de madeira são alguns dos serviços que expõem os trabalhadores a poeiras, assim como o corte e lixamento de mármores e granitos. A pintura de automóveis e outras peças metálicas, o manuseio de grãos, a aplicação de pesticidas e o atendimento hospitalar em prontos-socorros e áreas sujeitas à contaminação biológica são outros exemplos de trabalhos que sempre exigem os EPRs.
Os respiradores também são necessários, mas de forma ocasional, em trabalhos de operações de soldagem e fusão de metais; carregamento e descarregamento de produtos químicos; trabalhos em espaços confinados, etc. Em se tratando de emergência, os casos mais comuns em que os equipamentos se tornam indispensáveis são em incêndios e emissões de gases e vapores tóxicos e atendimento a vazamentos de produtos químicos perigosos nas formas sólida, líquida ou gasosa.
ATIVIDADES ROTINEIRAS
No caso das atividades que rotineiramente exigem os EPRs, é preciso saber quais são os contaminantes presentes e suas concentrações. Como auxílio, o PPR da Fundacentro permite que se faça uma estimativa de concentrações ambientais e vai além, trazendo um método para seleção de respirador sem a necessidade de avaliação quantitativa (Anexo 5 da publicação).
Quando a atividade rotineira exigir muito esforço físico, com alta demanda fisiológica, os respiradores precisam ser mais leves, não somente no que se refere ao peso do equipamento, mas também à resistência à respiração, que está relacionada à dificuldade da passagem do ar inalado e exalado pelo filtro. Os respiradores descartáveis possuem resistência à respiração mais baixa que respiradores com filtros substituíveis, porém seu uso é limitado a situações com presença de particulados. Respiradores descartáveis não protegem contra gases e vapores.
Outro fator importante de ser analisado é a existência ou não da válvula de exalação. No processo respiratório há duas fases: inalação e exalação. A fase de inalação é forçada pela movimentação do tórax, já a exalação é um processo de relaxamento do tórax. Quando se tem uma resistência à passagem do ar nessa última fase, o trabalhador vai sentir mais que a resistência à inalação. Por isso, a importância da válvula. Ainda deve-se ter cuidado especial com a qualidade da válvula. Ela deve permitir a saída do ar exalado de forma bem natural, mas impedir a passagem do ar inalado, pois este está contaminado e precisa passar pelo meio filtrante.
Muitas válvulas de exalação utilizadas em respiradores descartáveis não funcionam bem porque oferecem resistência à exalação maior que a resistência do filtro. Outros modelos de respiradores como linha de ar comprimido e respiradores motorizados são boas opções para situações de trabalhos pesados, ao mesmo tempo que propiciam maior nível de proteção global.
TEMPERATURAS
Ambientes muito frios ou muito quentes exigem cuidados especiais na seleção de respiradores. No caso de ar frio, pode ser uma boa opção utilizar respiradores descartáveis sem válvula de exalação, uma vez que eles mantêm uma atmosfera aquecida e umedecida no espaço ‘morto’ criado entre a superfície do respirador e as vias respiratórias do usuário. De forma inversa, em ambientes quentes deve-se dar prioridade para o uso de respiradores leves, com baixa resistência à passagem do ar inalado e, principalmente, do ar exalado. A válvula de exalação ajuda a manter o espaço ‘morto’ mais refrigerado, não retendo o calor da exalação.
Usando o mesmo raciocínio feito para atividades que demandam muito esforço físico, respiradores de linha de ar e motorizados são muito bem aceitos nesses ambientes com alta temperatura. Existe um modelo de respiradores de linha de ar que incorpora um resfriador de ar, possibilitando que o trabalhador receba ar puro e refrigerado, o que seria ideal para ambientes com alta temperatura. Atenção redobrada deve ser dada para situações com alta demanda fisiológica em ambientes quentes. O uso de respiradores que dificultem a respiração poderá aumentar ainda mais a demanda fisiológica e causar estresse térmico.
VEDAÇÃO
Em relação aos fatores relacionados aos usuários do Equipamento de Proteção Respiratória, o principal deles é a vedação facial. Ela depende de características faciais do usuário e do tipo de respirador que está sendo selecionado para o uso específico. Deve-se verificar se o tamanho da cobertura facial é adequado ao trabalhador; se existe algum aspecto que dificulte a vedação facial, como barbas, cicatrizes, etc. Lembrando que os respiradores com vedação facial foram desenvolvidos para promover vedação adequada em 95%, ou mais, das diferentes características faciais encontradas na população em geral.
O uso concomitante de outros EPIs com os Equipamentos de Proteção Respiratória pode causar problemas relativos à vedação do respirador na face. Por exemplo, uso de peças semifaciais descartáveis ou com filtros substituíveis combinado com óculos de proteção pode causar dificuldades para se conseguir uma boa vedação do respirador na face do usuário. Deve-se dar preferência ao uso de respirador facial inteiro nessa situação. O uso de peça facial inteira é requerido no caso de gases e vapores que irritam ou causem problemas nos olhos. Capacetes e protetores auditivos também podem interferir na vedação facial de respiradores.
Por todas essas questões, é fundamental a realização de um ensaio de vedação facial sempre que o respirador exigir.
OCASIONAL OU EMERGÊNCIA
Já os usos não rotineiros e emergênciais de Equipamentos de Proteção Respiratória são situações que expõem os trabalhadores, na maioria das vezes, a riscos desconhecidos. Para selecionar um respirador nesses casos, primeiramente deve-se verificar se há algum elemento que permita estimar o risco.
Ambientes que exponham o trabalhador a atmosferas imediatamente perigosas à vida ou à saúde, por presença de agentes químicos nocivos ou falta de oxigênio, só podem ser adentrados com uso de máscaras autônomas. Por outro lado, se a atmosfera local estiver sob controle, monitorada ou conhecida, pode-se seguir os passos normais de seleção de respiradores para uso rotineiro, levando-se em consideração os tópicos mencionados anteriormente: circunstâncias que requerem o uso do EPR; atividades desenvolvidas pelos trabalhadores; características ambientais; e uso em conjunto com outros EPIs.
Vale destacar que o ensaio de vedação, quando necessário, deve ser realizado antes do uso do respirador, e ser repetido sempre que houver alguma alteração nas características faciais do usuário como implantação de dentes postiços, cicatrizes, aumento ou diminuição de peso significativos, ou anualmente.
Ainda, a verificação de vedação é um teste que precisa ser feito toda vez que o respirador for colocado na face do usuário. Esse teste deve estar descrito na embalagem ou bula que acompanha o produto. Existem respiradores motorizados e de linha de ar comprimido que não exigem vedação facial para garantir a proteção do trabalhador.
Após a seleção dos Equipamentos de Proteção Respiratória, e antes do uso, também é preciso promover a capacitação de trabalhadores, supervisores, pessoal de suprimento e demais envolvidos. O treinamento deve contemplar os riscos que os respiradores buscam eliminar ou mitigar, incluindo os efeitos dos contaminantes sobre o sistema de saúde do trabalhador e os meios de controle existentes, incluindo os respiradores. É importante que os participantes entendam perfeitamente as características, limitações de uso, cuidados para manutenção, guarda e limpeza dos EPRs. Por fim, e talvez o mais importante: os usuários devem saber colocar o respirador de forma a obter boa vedação facial e maior segurança. Isso inclui ensaios de vedação que podem ser qualitativos ou quantitativos e métodos para verificação da vedação. A capacitação deve ser realizada de forma anual.
Fonte: Revista Proteção