01/07/2022

ABHO solicita prorrogação da consulta pública dos anexos das NRs 9 e 15

O prazo solicitado pela ABHO no documento é para meados de setembro, o que viabilizará o trabalho que a entidade pretende realizar.

Por Paula Barcellos / Jornalista da Revista Proteção

A ABHO (Associação Brasileira de Higienistas Ocupacionais) enviou, no último dia 15 de junho, um ofício à SIT (Secretaria de Inspeção do Trabalho) solicitando a dilatação do prazo para as contribuições às consultas públicas nº 4/2022, que trata da inclusão de anexos de Químicos, Cancerígenos e Apêndices de Benzeno e Asbesto na NR 9 e nº 5/2022, que apresenta proposta para revisão de anexos de químicos da NR 15. Ambas foram publicadas no dia 30 de maio, no Diário Oficial da União, pelo MTP (Ministério do Trabalho e Previdência) e ficarão disponíveis por 60 dias. “Receamos que na falta do tempo adequado para a ampla discussão, será difícil obter textos finais com a qualidade técnica compatível com a proteção dos trabalhadores que todos almejamos. Portanto, enviamos este ofício e esperamos ser atendidos nesse nosso pleito para que possamos contribuir com revisões qualificadas, com parâmetros capazes de proteger a saúde dos trabalhadores brasileiros”, destaca o presidente da ABHO, Luiz Carlos de Miranda Júnior.

O prazo solicitado pela ABHO no documento é para meados de setembro de 2022, o que viabilizará o trabalho que a entidade pretende realizar até a conclusão do 16º CBHO (Congresso Brasileiro de Higiene Ocupacional), que ocorre em 22 e 24 de agosto próximo, na cidade de São Paulo. Para Miranda, colher as opiniões dos higienistas ocupacionais associados e compilá-las requer tempo e dedicação e, nesse sentido, haverá uma grande oportunidade de se realizar um bom trabalho no 16º Congresso. “Nele, teremos condições de realizar discussão qualificada para contribuir com sugestões que possam agregar ainda mais qualidade técnica aos textos ora submetidos à consulta pública”, reflete.

OBSOLETAS

Miranda revela que há muito tempo a ABHO vem indicando a necessidade de revisões das Normas Regulamentadoras 9 e 15, primordiais para a prática qualificada da Higiene Ocupacional. “Em 2006, o tema do primeiro Congresso Brasileiro de Higiene Ocupacional foi ‘Prevenir Atualizando’. Na época já causava indignação o obsoletismo da NR 15 depois de quase 20 anos de sua publicação em 1978”, desabafa. Diante disto, em 2010, durante o 5º CBHO, a associação aprovou uma Moção pela revisão da NR-15, documento em que expressava sua grande preocupação com a desatualização desse texto legal.

Neste momento, apesar de comemorar a oportunidade tão desejada de rever partes importantes das NR 9 e NR 15, conforme consultas públicas lançadas pelo Governo, a associação não enxerga nelas a atualização necessária. “Em uma análise preliminar dos mencionados textos reconhece-se alguns avanços relevantes, que poderão melhorar a prevenção de doenças ocupacionais no campo da Higiene Ocupacional, cujo objetivo é gerenciar as exposições ocupacionais aos agentes físicos, químicos e biológicos, por meio de ações de antecipação, reconhecimento, avaliação e controle das condições e locais de trabalho, visando à preservação da saúde e bem-estar dos trabalhadores, considerando ainda o meio ambiente e a comunidade. Apesar de todo o tempo que se esperou para uma atualização da NR-15 (44 anos), não se vislumbra o aperfeiçoamento desejado, diante de todo progresso visto nessas últimas décadas no campo da ciência e tecnologia. Corre-se, portanto, o risco de se ter apenas um remendo e não uma atualização apropriada”, alerta Miranda.

Conforme o presidente, além do escasso tempo para a consulta pública, alguns tópicos preocupam a entidade nos textos, entre eles a manutenção de lista desatualizada dos LT (Limites de Tolerâncias) publicada no Quadro II – Limites de Exposição Ocupacional (estabelecidos antes de 2022). Organizações estrangeiras ou internacionais, como a ACGIH® (American Conference of Governmental Industrial Hygienists), contam com LEO (Limites de Exposição Ocupacionais) em maior número e atualizados. “Por que, então, não promover atualização completa dos LT a partir dos TLV® –  Threshold Limit Values – da ACGIH®, e outros LEO adotados por renomadas agências estrangeiras e internacionais?”, questiona Miranda. Outra preocupação é que os conceitos e as definições devem estar alinhados com as literaturas e os glossários técnicos. Abaixo, a entidade lista alguns tópicos que a preocupam nas NRs 9 e 15 em consulta pública.

Miranda acredita que um prazo adequado para as contribuições trará uma legislação mais forte. “Para um assunto que permanece inalterado há mais de 40 anos, não haverá problemas em aguardar mais alguns meses e lançar uma nova legislação melhor fundamentada. A exposição ocupacional aos agentes ambientais, químicos, físicos e biológicos é um assunto que exige alto grau de expertise e experiência. Sem uma legislação forte, sólida, técnica, atualizada e coerente haverá, em futuro próximo, uma legião de trabalhadores doentes e um sem número de questões trabalhistas, criando um limbo de ações que gera mais calor que luz, e as disputas na justiça não protegem o trabalhador, antes protelam sua proteção”, finaliza.

Preocupações da entidade em relação a aspectos gerais da consulta

Para a ABHO os critérios de decisão de uma situação de exposição ocupacional, tanto na NR – 09 quanto na NR-15, devem ser os mesmos.  “Não se pode correr o risco de uma esquizofrenia normativa, quando uma norma diz que a situação está ok e a outra diz que não”, alerta a entidade explicando que as consequências do não atendimento evidentemente serão diferentes, na insalubridade e na inadequação técnica, mas o critério de inadequação deve ser um só (mesmos descritores e critérios). Confira os aspectos que segundo a associação precisam ser reavaliados e modificados:

  • Insistir na manutenção do Anexo 13 – Agentes Químicos para caracterização qualitativa da insalubridade é persistir em um erro quase secular, pois esse dispositivo tem sua origem em 1936, quando se chamava “Quadro da Indústrias Insalubres”.
  • Há uma questão de denominação que precisaria ser analisada para propiciar segurança jurídica (Lei 6514 – Artigo 189). Na revisão, foi adotado Limite de Exposição Ocupacional, mais correto, sem dúvida, mas diferente da base legal, Limite de Tolerância.
  • Atualmente a lista mundial dos Limites de Tolerâncias (TLV® e outros parâmetros) é muito maior do que a existente em 1978. Por que, então, não considerar tudo o que está na ACGIH® e em outras listagens adotadas por renomadas agências estrangeiras e internacionais? Caso não se deseje unicamente a utilização dos TVL® da ACGIH®, adotar a moda estatística (valor mais frequente) entre os que aparecem nas várias listagens de Limites de Exposição Ocupacional – de agências estrangeiras, comunitárias (Europa) e Internacionais.
  • Deve-se evitar ser determinístico, sobretudo ao se falar de parâmetros técnicos estatísticos (descritores) para a adequação da exposição (critérios), pois há várias opções conceituais igualmente competentes.  Da mesma forma isto deve ser observado ao se tratar da unificação de uma matriz exposição-dano, conforme a preconizada, pois tal matriz adquire contornos específicos nos campos da Higiene Ocupacional e da toxicologia (dentro do PGR), sendo preferível que não se defina um “tamanho único” para todos tamanhos e formatos de atividades industriais e ocupações.

Preocupações da entidade em relação a aspectos específicos

A ABHO elenca os principais pontos embora reforce que deverão ser adequadamente detalhados com fundamentação técnica se obtiverem o prazo complementar requerido:

  • Os conceitos e as definições devem estar alinhados com as literaturas e os glossários técnicos. Todas as normas e anexos devem contar com glossários técnicos.
  • NR-15, Anexo 11, item 2 – Deve ser explícito que, havendo exposição inadequada pela via dérmica, a adequação da exposição com os dados da via respiratória não pode ser validada em nenhuma hipótese e será inconclusiva.
  • NR-09, Anexo XX: Agentes Químicos, item 5.3.d), valor de corte ou limite de concentração em misturas, para considerar exposições como “não ocupacionais”, carece de maior explicação e até exemplos, pois pode haver mal-entendido em relação à tabela.  Observe-se que, por exemplo, pode haver o entendimento de que 1% é uma baixa exposição, porém, no ambiente, 1% são 10.000 ppm.  Então, é preciso esclarecer a que se referem tais porcentagens para que se evitem intepretações futuras perigosas para os trabalhadores.
  • As propostas não preveem explicitamente uma abordagem gradativa para avaliação da exposição, não detalha o uso de ferramentas pragmáticas (Control Banding) e modelagem matemática, nem possibilita a aplicação de dados sub-rogados, o que permite decisões preliminares rápidas (para a adequada proteção do trabalhador), a serem corroboradas na fase quantitativa ortodoxa.
  • NR-09, item 6.6 e seguintes – Como observado anteriormente, aparecem vários descritores estatísticos de exposição, o que pode causar controvérsia, alguma confusão e dificuldade de decisão. Encontramos:  
  • Em modelagem semiquantitativa, o limite superior da mediana a 95%; 
  • na avaliação quantitativa ortodoxa, a média geométrica (para até 5 medições) e
  • o limite superior a 95% da média aritmética para 6 ou mais medições. 

CRÍTICA AOS DESCRITORES

Em relação ao último item que trata dos descritores estatísticos, a entidade chama a atenção para o fato de que haverá certa confusão e situações em que uma alternativa de avaliação indique adequação, enquanto outra não. Adicionalmente, acrescenta que deve ser lembrado que a média geométrica é o descritor menos indicado, em qualquer situação, conforme já alertado pela AIHA (American Industrial Hygiene Association) há muito tempo. 

A entidade esclarece que a média geométrica é sempre MENOR que a média aritmética, “aliviando” o peso da exposição e, se algum dos valores medidos for “zero”, a média geométrica será ZERO.  “Ora, esta pode ser uma grande incongruência para com a exposição sofrida pelo trabalhador, em qualquer caso”. Deve ser lembrado, de acordo com os especialistas, que, atualmente, um dos melhores descritores de média (se desejado o uso da média), é a média sem viés de mínima variância (MVUE), e que o descritor e a salvaguarda estatística “equilibrada” mais sensatos é o ponto percentil 95 da distribuição com 70% de confiança, pois tal providência promoverá um equilíbrio entre “falsos positivos” e “falsos negativos” nas decisões sobre uma situação de exposição.

A associação informa que este último descritor, inclusive, é adotado como parâmetro estatístico regulatório na França, é estabelecido como parâmetro estatístico para avaliação da exposição pela British Occupational Hygiene Society (BOHS) / Dutch Occupational Hygiene Society – NVvA / Belgian Society for Occupational Hygiene – BSOH e pela norma Europeia EN689:2018, e foi acordado como o critério de tolerabilidade das exposições pela AIHA, no curso preparatório para o programa de registro de especialistas em análise de decisão da exposição. “Tal unanimidade é notável e deveria ter sido levada em conta”, finalizam os especialistas da entidade.