21/11/2022

Quais fatores devem ser considerados em uma avaliação da exposição aos agentes biológicos?

A avaliação de agentes biológicos pode ser de extrema dificuldade para os profissionais de segurança do trabalho e higiene ocupacional por diferentes motivos.

O primeiro deles diz respeito a própria formação do profissional, pois na maioria das vezes técnicos e engenheiros de segurança do trabalho não possuem familiaridade com os conceitos de biologia e epidemiologia que estão fortemente atrelados ao tema em questão, além de outros parâmetros de bioquímica presentes nas peculiaridades da exposição ocupacional aos micro-organismos.

A segunda razão diz respeito a pequena quantidade de materiais disponíveis em língua portuguesa sobre o tema. O pouco que temos ainda está muito vinculado à caracterização do adicional de insalubridade pelo Anexo 14 da NR 15, ou seja, um texto que não reflete o avanço científico em termos do conhecimento de diferentes parâmetros técnicos que emergiram nas últimas décadas. Infelizmente, grande parte dos debates e trocas de informações sobre os agentes biológicos ficam restritos ao tema legalista do adicional supracitado; raros são os casos onde temos o compartilhamento de informações preventivas, com a pauta centrada nas boas práticas de biossegurança.

Por questões de extensão do texto, não citarei outros motivos, mas espero que as atualizações das normas regulamentadoras sejam assertivas na construção e na atualização dos textos técnicos, tendo a tal da nossa subvalorizada prevenção como base.

Quando estou em campo analisando um determinado Grupo de Exposição Similar – GES, verifico sempre as questões abaixo referentes às exposições aos agentes biológicos em uma determinada atividade:

  • Análise das tarefas executadas em cada processo de trabalho;
  • Identificação dos micro-organismos mais prováveis, em função do local de trabalho, materiais manipulados e da localização geográfica do estabelecimento;
  • Fontes de geração e reservatórios (animados: pessoas, animais, insetos ou inanimados: água, alimentos, mobiliários, instrumentos de trabalho);
  • Meios de dispersão dos micro-organismos (via aérea, percutânea, por meio de vetores, etc.)
  • Patogenicidade (capacidade do agente biológico causar uma doença), virulência (a gravidade do dano causado pelo micro-organismo patógeno);
  • Classificação do agente biológico usando algum parâmetro técnico, como os anexos I e II da NR 32 ou mesmo a NTP 833 do INSST da Espanha (sugiro a leitura desta última norma em: https://www.insst.es/documents/94886/326775/833+web.pdf/a8b17b38-f44c-4e9b-85af-afcaf1c48e7f?version=1.1&t=1617979125904);
  • Associação do agente biológico com algum agente químico (bactérias que se propagam em fibras de algodão, endotoxinas presentes nas fibras geradas nos processos de trituração da cana-de-açúcar) ou mesmo as características de esporulação de uma colônia de bactérias em um determinado pH (potencial hidrogeniônico), e também em função da temperatura, pressão e umidade relativa do ar.
  • Persistência do agente biológico no ambiente (quando fora do hospedeiro, exposto à radiação ultravioleta, níveis variados de umidade relativa do ar, temperatura, luz solar direta, tipo de superfície e o estimado tempo de dessecação);
  • Medidas de controle implementadas (medidas de proteção coletiva: pressão negativa, cabinas de segurança biológica, processos de filtração do ar; medidas administrativas: treinamentos, procedimentos, implementação do Programa de Proteção Respiratória – PPR e do Plano de Manutenção Operação e Controle – PMOC; medidas de proteção individual: uso do Equipamento de Proteção Individual – EPI apropriado, bem como o método de seleção, auditoria de uso, treinamento como já mencionado, periodicidade de troca).
  • Doenças profissionais ou do trabalho já diagnósticas e que tenham nexo de causalidade com a exposição a um determinado micro-organismo identificado em algum setor ou atividade.
  • Estudos epidemiológicos e estatísticos realizados dentro do próprio estabelecimento ou por instituições cientificamente reconhecidas que possam subsidiar os processos de identificação de perigos, avaliação de riscos e a adoção de medidas de controle.
  • A própria percepção de riscos e a visão do empregado quanto as soluções que podem ser implementadas na empresa (devemos ver os empregados como parte da solução, agregando a percepção destes aos processos de gerenciamento das medidas de controle, não apenas partindo de um pré-conceito onde o empregado é julgado apenas como um problema a ser corrigido).   

Os doze tópicos acima não são exaustivos, haja vista que eles retratam as informações que eu considero essenciais em uma avaliação de riscos biológicos com base na experiência que obtive em diferentes situações de trabalho e pesquisa.

Outro ponto a ser destacado é que parto do princípio da prevenção como fora dito; reforço que estou enfatizando um processo de identificação de perigos e avaliação de riscos para fins de gestão, não estou aqui estabelecendo um método para avaliação de agentes biológicos para fins de caracterização do adicional de insalubridade ou mesmo da aposentadoria especial, já estamos cheios de textos produzidos com esta finalidade.

Vamos prevenir!


Fonte: Revista Proteção - Artigo de Gustavo Rezende de Souza

No YouTube – Professor Gustavo Rezende – Higiene Ocupacional
No Instagram – @professor_gustavorezende
No LinkedIn – Gustavo Rezende de Souza